quarta-feira, 24 de novembro de 2010

As minhas... (do Vitor Dias)... lições do dia






(não por acaso, é esta a foto de topo deste «post»: piquete no Call Center da PT no Areeiro)

Diga o que disser o outro lado da barricada, a verdade dura e forte como punhos é que, num país em que a opinião pública tem estado a sujeita a um brutal rolo compressor favorável à resignação, à apatia, à proclamação da alegada falta de alternativa e ao «é mau mas tem de ser» e em que 30% dos trabalhadores têm tragicamente vínculos laborais precários, a greve geral de hoje constitui um grande, marcante e assinalável êxito e uma poderosa e inarredável manifestação de protesto popular e de exigência de uma outra política e de um outro rumo para o país.

Desde logo, a greve geral, com a expressão o impacto que teve, representa uma fortíssima e inapagável pressão social contra a aprovação daqui a dias de um Orçamento íniquo que não só consolida e agrava toda uma infame política de fazer pagar aos trabalhadores e às camadas sociais menos protegidas o preço exclusivo de uma crise que não provocaram como, no plano nacional, traduz a aplicação de uma orientação para o desastre, na exacta medida em que agravará todos os problemas e causas de fundo que, em parte decisiva, conduziram e explicam a situação em que o país está.

É isto que importa sublinhar a traço forte, fora de cálculos de probabilidades sobre as profundíssimas rectificações no Orçamento que são social e nacionalmente indispensável. Podem as forças políticas aliadas, cúmplices e siamesas na defesa deste Orçamento e na defesa dos ilegítimos e egoistas interesses de classe que representam, não quererem ouvir esta voz que hoje ressoou límpida, clara e convicta por todo o país. Mas se, de forma cega e autista o fizerem, estejam certos que essa voz, feita de muitas centenas de milhares de vontades e consciências, o vai fixar na memória e com eles ajustar contas na primeira oportunidade.

Para além disso, decisivo e fundamental é compreender que o processo social de luta em que a greve geral se insere tem um significado e um horizonte que ultrapassam em muito a questão do Orçamento e que hoje se afirmou no país uma enorme disposição que vem para ficar e para ser o impulso forte e combativo para todas as pequenas e grandes lutas que os próximos tempos continuarão a reclamar imperativamente, sector a sector, empresa a empresa, medida a medida, luta a luta, batalha a batalha, e nacionalmente.

Para já não falar da vergonhosa «técnica» do governo de, em vez de contar percentagens de adesões, contar percentagens de serviços públicos abertos (podem estar abertos e terem lá dentro só 5 de 30 trabalhadores!), é claro que já ai está e estará nos próximos dias um dos mais bafientos truques argumentativos que consiste em atribuir um enorme significado menosprezador à falsa e viciosa ideia de que «praticamente a greve geral só teve expressão significativa no sector público e fraquíssima adesão no sector privado». Sobre este truque apenas duas notas: a primeira é para perguntar se os que tal coisa papagueiam na comunicação social nos oferecem também na comunicação social o espaço e tempo para apresentar a lista de todas as empresas privadas em que a adesão à greve geral foi muito significativa (foi isto que fiz em curto em resposta a Miguel Sousa Tavares na última greve geral); a segunda é para, mesmo admitindo que globalmente haja diferenciais entre adesão no sector público e privado, lhes perguntar se querem ter a caridade de nos explicar a bondade do fenómeno ou, melhor dizendo, se têm o despudor de nos dizer que assim é porque nas empresas privadas há mais liberdade e menos constrangimentos ou de nos confessar que a explicação está precisamente no contrário.

De uma importância muito maior do que se poderá supôr é que a greve geral de hoje, num país com um panorama mediático que tende a apresentar apenas como grandes protagonistas da vida nacional governantes, empresários e economistas do «pensamento único», veio recolocar no seu devido lugar central na vida do país e da democracia o trabalho e os trabalhadores, a sua consciência, vontade e direitos e o seu atributo de criadores essenciais da riqueza nacional e de construtores insubstituíveis de um futuro melhor.

E, por fim mas bem podia ter sido no príncipio, é a hora de gritar bem alto que quer os homens e mulheres que, num tempo de tanta pressão para o egoismo e o ensimesmamento individual, generosa e sacrificadamente prepararam e organizaram a greve geral quer as mulheres e os homens que a ela aderiram ou a apoiaram ou lhe prestaram solidariedade de pensamento são os nossos verdadeiros heróis da verticalidade, da dignidade, da luz e da esperança nos ásperos, sombrios e desafiantes tempos que vivemos.

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