domingo, 29 de agosto de 2010

Há receitas para a felicidade?

O que queremos verdadeiramente é, sem sombra de dúvida, ser felizes. Mas como se chega à felicidade? É que, para se ser feliz, é necessária uma multidão de coisas e de condições: algum prazer, saúde, uma vida familiar agradável, realização profissional mínima, reconhecimento social, algum dinheiro, amigos - "sem amigos, ninguém escolheria viver", disse Aristóteles. Depois, também é preciso ter sorte, como diz a própria palavra no seu étimo (felix), e isso não acontece apenas com felicidade (felicidad, em espanhol, e felicità, em italiano): o Glück alemão significa felicidade e sorte, a raiz de happiness é happ, com o significado de acaso, fortuna (perhaps significa talvez), o mesmo acontecendo nas palavras grega e francesa, respectivamente: eudaimonia e bonheur.

E há choques, oposições, contradições. O Prémio Nobel da Literatura Heinrich Böll escreveu uma estória cheia de humor e sentido - eu ouvi-a ao Padre Tony de Mello. Chega um turista e dialoga com um pescador pobre, a apanhar sol na praia, com o resultado da sua pescaria: dois peixes. - Porque não pescas mais? - Para quê? - Para teres dinheiro, criavas uma empresa, tinhas muitos empregados, eras cada vez mais rico, exportavas, montavas mais empresas... - E depois?, pergunta o pescador. - Serias tão rico que já nem precisavas de trabalhar e passarias os dias na praia a apanhar sol... - Mas é precisamente o que estou a fazer, sem ter de passar por toda essa trapalhada, atirou-lhe o pescador.

Sob certo aspecto, é o pescador que tem razão. Será que precisamos de tanta quinquilharia, da qual já não conseguimos prescindir e pela qual nos desgraçamos a trabalhar? Por outro lado, o que seria a vida sem iniciativa e realizações? Hegel foi avisando que as páginas da história sem sofrimento são páginas em branco.

Há filósofos que colocaram a raiz da felicidade no prazer. Mas eles próprios foram prevenindo que há prazeres e prazeres e que os prazeres não podem ser desregrados. Outros apelaram para a virtude: o sábio é livre, porque consente no que não depende dele. Residirá a fonte da felicidade no poder? Seja como for, a omnipotência é uma ilusão. Não há felicidade perfeita neste mundo, só "ilhas de felicidade". No fim, é a morte que nos espera.

Mas há algumas regras práticas, a partir também de conhecimen-tos da neurofisiologia, para uma vida minimamente feliz. Enumero algumas, segundo o filósofo Richard D. Precht, numa estimulante viagem filosófica: "Wer bin ich und wenn ja, wie viele?" (Quem sou eu, e, se sou, quantos?).

Primeira regra: actividade. "Os nossos cérebros estão ávidos de ocupação". Para lá do ter e do ser, é preciso agir, sem agitação.

Segunda regra: vida social. A amizade, o casamento, a família, provocam o sentimento de protecção. Quem tem uma rede densa de relações não enfrenta sozinho preocupações e angústias.

Terceira regra: concentração. É preciso aprender a fruir o aqui e agora nos prazeres simples: o perfume de uma rosa, a sua beleza, o sabor de um vinho excelente. Não se pode viver obcecado com o futuro. Quem só espera vir a ser feliz nunca é feliz.

Quarta regra: expectativas realistas. "Comete-se muitas vezes o erro de exigir demais de si, mas também o de não exigir suficientemente. As duas atitudes geram insatisfação."

Quinta regra: pensamentos positivos. Embora seja mais fácil de dizer do que de conseguir, é preciso ter em atenção a astúcia dos psicólogos: "procede como se fosses feliz, e sê-lo-ás".

A sexta regra refere-se à capacidade de aprender a arte de lidar com as dificuldades e o sofrimento. Há crises salutares na vida.

Finalmente, a alegria pelo trabalho. "O trabalho é a melhor das psicoterapias." É sabido que para Freud a felicidade consistia em "poder amar e trabalhar".

Mas o ser humano vive numa tensão permanente: é um ser de desejo insaciável, de tal modo que o que alcança nunca o satisfaz plenamente. Por isso, Paul Ricoeur falava da "tristeza da finitude" e Santo Agostinho escreveu: "O nosso coração está inquieto enquanto não repousar em ti, ó Deus."


por ANSELMO BORGES (padre) DN 28.8.2010

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Morre lentamente quem não viaja

"Morre lentamente quem não viaja,
Quem não lê,
Quem não ouve música,
Quem destrói o seu amor-próprio,
Quem não se deixa ajudar.



Morre lentamente quem se transforma escravo do hábito,
Repetindo todos os dias o mesmo trajecto,
Quem não muda as marcas no supermercado,
não arrisca vestir uma cor nova,
não conversa com quem não conhece.
Morre lentamente quem evita uma paixão,
Quem prefere O "preto no branco"
E os "pontos nos is" a um turbilhão de emoções indomáveis,
Justamente as que resgatam brilho nos olhos,
Sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos.
Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho,
Quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho,
Quem não se permite,
Uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.
Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte ou da
Chuva incessante,
Desistindo de um projecto antes de iniciá-lo,
não perguntando sobre um assunto que desconhece
E não respondendo quando lhe indagam o que sabe.
Evitemos a morte em doses suaves,
Recordando sempre que estar vivo exige um esforço muito maior do que o
Simples acto de respirar.
Estejamos vivos, então!”


Pablo Neruda

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Sobre a candidatura presidencial

Declaro que sempre concordei com a apresentação e apoio de um candidato à Presidência da República, militante ou da área do Partido Comunista Português. Pela necessidade de marcar uma posição clara sobre o momento politico-social e, quantos mais canditos houver para fixar o eleitorado de esquerda, mais provável haver segunda volta eleitoral.

Outra coisa é ficar entusiasmado com o candidato anunciado. Tenho boas relações pessoais com o Francisco Lopes, mas acho que não reune as características para esta exigente tarefa. Mas, sinceramente, espero ser surpreendido! O meu voto está garantido mas, para já, não bato palmas.

sábado, 21 de agosto de 2010

Hoje é o Dia Mundial da Fotografia


"Uma imagem vale mais do que mil palavras"
Uma referência especial para o meu repórter fotográfico...

Um dia parti, em busca de mim

Um dia parti
Rumo ao desconhecido
Levando comigo a força de uma guerra sem fim
E de um sonho teimoso desejando existir
Sempre



Um dia com o anoitecer
Com as sombras envolventes e os vazios ao meu lado
Subi mais alto que as nuvens dos céus
E dali, bem lá na alturas
Abracei as estrelas,e pisquei o olho à lua
Que me observava inquieta.



Um dia quis acordar
Mas percebi desse querer, e de tentar,
Que efectivamente nunca tinha estado ali,
Naquele espaço demasiado pequeno e estreito
Nesse mundo apinhado e à deriva
Catapultado entre galácteas e corpos
Que é o lugar da vida de todos nós.



Um dia quis partir
E acordei, de um inexistir permanente
E pulei desejando ultrapassar o delírio
De uma obssessiva e vitalícia ilusão
Ou simplesmente, de um vago ser ou estar,
Buscando mais que a descoberta
De algo que pudesse encontrar
Fora de mim,
Pudesse paulatinamente
Como num acordar prioritário
Tocar-me, e olhar-me
A mim mesmo.



Em busca de mim
à procura de um existir
Que se desconhece como real
Mas que cremos é verdadeiro
Parti. Em demanda, à descoberta
Em peregrinação
Em viagem sem fim
Procurando encontrar bem no fundo
A razão de tudo
A essência
Um pouco de mim.



Um dia parti...

(de P A Cruz)

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Desta vez, estou de acordo com Ferreira Fernandes

A soldado desconhecida
por FERREIRA FERNANDES


Josefa, 21 anos, a viver com a mãe. Estudante de Engenharia Biomédica, trabalhadora de supermercado em part-time e bombeira voluntária. Acumulava trabalhos e não cargos - e essa pode ser uma primeira explicação para a não conhecermos. Afinal, um jovem daqueles que frequentamos nas revistas de consultório, arranja forma de chamar os holofotes. Se é futebolista, pinta o cabelo de cores impossíveis; se é cantora, mostra o futebolista com quem namora; e se quer ser mesmo importante, é mandatário de juventude. Não entra é na cabeça de uma jovem dispersar-se em ninharias acumuladas: um curso no Porto, caixeirinha em Santa Maria da Feira e bombeira de Verão. Daí não a conhecermos, à Josefa. Chegava-lhe, talvez, que um colega mais experiente dissesse dela: "Ela era das poucas pessoas com que um gajo sabia que podia contar nas piores alturas." Enfim, 15 minutos de fama só se ocorresse um azar... Aconteceu: anteontem, Josefa morreu em Monte Mêda, Gondomar, cercada das chamas dos outros que foi apagar de graça. A morte de uma jovem é sempre uma coisa tão enorme para os seus que, evidentemente, nem trato aqui. Interessa-me, na Josefa, relevar o que ela nos disse: que há miúdos de 21 anos que são estudantes e trabalhadores e bombeiros, sem nós sabermos. Como é possível, nos dias comuns e não de tragédia, não ouvirmos falar das Josefas que são o sal da nossa terra?

Sobre a saíde de tropas norte-americanas do Iraque

Se não avalio mal ou se não estou mal informado, estamos perante uma nova realidade creio que nunca vista ao longo do Século XX: as Forças Armadas de um país como os EUA até podem vir a retirar-se, como se diz, mais tarde ou mais cedo, do Iraque e do Afeganistão mas podem permanecer nesses países centenas de milhar de combatentes mercenários de nacionalidade norte-americana, dispondo de sofisticado armamento militar (incluindo aviões e helicópteros), sejam eles pagos pelo orçamento federal dos EUA ou pelo dinheiro do petróleo do Iraque e das papoilas do Afeganistão. E esta, hem ?
in "O Tempo das Cerejas"

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

SOBRE O POEMA (de herberto helder)

Um poema cresce inseguramente
na confusão da carne,
sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.


Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio,
as sementes à beira do vento,
- a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.


E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único,
invade as órbitas, a face amorfa das paredes,
a miséria dos minutos,
a força sustida das coisas,
a redonda e livre harmonia do mundo.

- Em baixo o instrumento perplexo ignora
a espinha do mistério.

- E o poema faz-se contra o tempo e a carne.

... não descansar à sombra da bananeira

Trabalhei. Esforcei-me. Fui perseverante. Cheguei a resultados profissionais merecidos, mas ainda insuficientes/poucos face às potencialidades existentes. Mesmo nas actividades sociais parece que subi um patamar em matéria de organização pois, com menos esforço e tempo, consegui intervir em tempo oportuno e com qualidade aceitável.

O próximo ciclo profissional (estou certo que todos os dias aparecerão novos problemas) terá de continuar a merecer grande empenho da minha parte. Decerto que os proveitos (de vários matizes) chegarão! Ao trabalho!

... engraçada

anedota

Um velho polaco diz para outro "afinal tudo o que o Partido nos dizia sobre o comunismo era mentira", responde o outro "o pior é que o Partido dizia sobre o capitalismo era verdade"

domingo, 1 de agosto de 2010

No aniversário do Manel. O meu mais velho...

FALA DO HOMEM NASCIDO


Venho da terra assombrada,
do ventre da minha mãe;
não pretendo roubar nada
nem fazer mal a ninguém.
Só quero o que me é devido
por me trazerem aqui,
que eu nem sequer fui ouvido
no acto de que nasci.

Trago boca para comer
e olhos para desejar.
Com licença, quero passar,
tenho pressa de viver.
Com licença! Com licença!
Que a vida é água a correr.
Venho do fundo do tempo;
não tenho tempo a perder.

Minha barca aparelhada
solta o pano rumo ao norte;
meu desejo é passaporte
para a fronteira fechada.
Não há ventos que não prestem
nem marés que não convenham,
nem forças que me molestem,
correntes que me detenham.
Quero eu e a Natureza,
que a Natureza sou eu,
e as forças da natureza
nunca ninguém as venceu.

Com licença! Com licença!
Que a barca se faz ao mar.
Não há poder que me vença.
Mesmo morto hei-de passar.
Com licença! Com licença!
Com rumo à estrela polar.

(António Gedeão)

Sobre dois processos de defesa do acesso à mobilidade

As acções relacionadas com a contestação ao pagamento de portagens na A 23 estão a arrefecer apesar das potencialidades de mobilização popular em torno desta causa. Falta organização, liderança, perseverança e ousadia. Há que arrepiar caminho, pois há homens e mulheres com muita capacidade envolvidos neste processo.

Por outro lado, as acções em torno da reivindicação da abertura da Ponte de Constância estão em crescendo, constatando-se análise da realidade social e socio-politica envolvente, organização e grande espírito de oportunidade. Parabéns ao povo do concelho de Constância (e de autarquias vizinhas), aos militantes políticos, autarcas e activistas sociais.