sexta-feira, 18 de março de 2016

Um poema por semana (12)

O SANGUE DAS PALAVRAS

O poeta que nasce é uma criança

parida pela água torturada

uma nave que surge uma nuvem que dança

ao mesmo tempo livre e condensada.

O poeta que nasce é a matança

da palavra demente e enjeitada

que o chicote do poema torna mansa

depois de possuída e mal amada.

Quando o poeta nasce a madrugada

aperta os versos num abraço rouco

até que a noite fique esvaziada.

E enquanto das palavras pouco a pouco

surge a forma perfeita ou agitada

no mundo morre um deus ou nasce um louco.

(...)

Versos? Paguei-os. Alegria e raiva.

As palavras por vezes impotentes

outras vezes escorrendo sangue e seiva

ao morderem a vida com os dentes.

Poesia que és uns dias minha noiva

com seios de palavras complacentes.

Poesia que outras vezes grita e uiva

fêmea capaz de fecundar sementes.

Poesia minha amiga minha irmã

mulher da minha vida que inventei

para fazermos filhos amanhã.

Poesia minha força e meu castigo

meu incesto tão puro que nem sei

se é verdade que faço amor contigo.


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